Li – recentemente – um autor dizendo que – em algum momento da história – a humanidade foi provida de referenciais que a direcionava na maneira como deveria agir nas mais diferentes situações.
Para esse mesmo autor, a epidemia de depressão atual teria como causa o fim desses referenciais. Será?
Penso que o agir humano é muito mais complexo que qualquer referencial. Não creio que possa existir qualquer coisa capaz de abarcar toda a complexidade da existência.
Algo da ação sempre escapa. Hoje, isso que foge, manifesta-se como depressão. No passado, manifestava como cegueiras, contraturas e paralisias.
Não creio na cura pelos referenciais. Aliás, prefiro sem referenciais – ficamos menos robóticos.
Quanto menos discurso, mais liberdade. Quanto menos saber, mais espaço para abarcar isso que foge à toda forma de categorização.
Vai para o corpo aquilo que a cultura não abarca. Frase bonita, não é? Creio nisso como uma invenção da própria cultura.
No fundo, somos incapazes de suportar nosso vazio. Necessitamos abarrotar isso de coisas – a sociedade de consumo sabe muito bem disso.
Não se trata de trocar o vazio por conteúdo. Não se trata de trocar o vazio por doenças – mesmo porque isso que nada preenche sempre retorna.
Trata-se de inventar outros modos – para além do discurso – para lidar com isso que nenhum discurso toca.
Evaristo Magalhães – Psicanalista