Antes éramos guiados pela cultura. A existência estava na dependência da razão. Fazia sentido ouvir o outro.
A literatura dava o tom do amor. A psicologia dizia de uma introspecção. Cultivávamos o afeto e os jovens se interessavam uns pelos outros como amigos e como amantes.
Havia o que buscar do lado de fora do eu. O eu era também o outro. Éramos pela diferença.
Não há mais a cultura. Não há mais a razão. Não há mais o sentido. Não há mais o olho no olho. Não há mais a literatura e as pessoas pouco sabem mais de si.
O que restou? Viramos autômatos. Perdemos o sentido. Nossos olhares esvaziaram-se de afeto. Não há mais o futuro. Não temos mais o que mirar.
Olhamos como se tudo fosse o mesmo do mesmo. Não nos relacionamos. Não há o que dizer. O mundo perdeu a consistência. Agredimos impulsivamente. Falamos como se estivéssemos surtados.
Não sabemos mais os motivos. Simplesmente fazemos. Não pensamos para executar. Não olhamos primeiro. Não pensamos que o outro pode ter razão. Falta critérios.
Transamos por instinto. Usamos drogas para mergulhar ainda mais no abismo do nosso vazio existencial.
Nossas músicas perderam a poética. Não sabemos o que queremos: podemos querer e ao mesmo não mais querer.
Estamos mais bonitos e mais tristes. Estamos muito bem equipados e perdidos. Não sabemos de quase nada achando que sabemos de tudo. Viramos mortos-vivos.
Evaristo Magalhães – Psicanalista