O pai não foi capaz de controlar a sua prole: não havia pai suficiente para vigiar todos os filhos. Na ausência do olhar paterno, os filhos descobriram a perversão.
Para conter a perversão foi necessário criar um pai espiritual, onisciente e onipresente: um deus-pai.
Ocorre que ficou inevitável não perguntar pelo criador desse deus-pai do céu. Não houve resposta porque esse deus-pai não podia ter sido criado – pois uma vez criado, ele se perderia em uma lógica – sem fim – de quem criou quem.
Foi preciso instituir um deus-pai do tipo: sou o que sou. Ou seja, um deus-pai criador de si mesmo. Como alguém pode se dar à própria criação? Como alguém pode nascer de si mesmo? Isto não fazia o menor sentido. Morre deus.
Sem o pai físico e sem o pai espiritual, como fazer para conter a perversão? Tudo passou a ser permitido? Não. Qual é o critério? O mal.
Entra em jogo a filosofia. O indivíduo conquistou a liberdade com a condição de que esse direito fosse estendido aos demais. O indivíduo podia fazer o que quisesse – com a condição de que agisse sem colocar em risco o direito do outro de – também – agir livremente.
Agir com violência era dar ao violentado o direito de pagar com a mesma moeda: retornaríamos à barbárie.
Isto impediu a perversão? Não. Muitos passaram a ser violentos sem serem violentados – porque se blindaram com a força do Estado. Tomaram a lei para si.
Agora – e acima do bem e do mal – estão ilesos de responder por seus atos.
Esses senhores se sustentam na violência como um direito. O poder ganhou a prerrogativa da perversão.
Não há mais o poder do poder: ele personificou-se.
Estamos a um passo do fascismo!
Evaristo Magalhães – Psicanalista